Que nossa ilha está predestinada a afundar ou perder superfície para as águas é coisa mais que sabida no rumor dos interiores. Dizem até que, sob a lua cheia, as bruxas do Cascaes contaram algum causo sério sobre a irremediável submersão.
Isto posto, fui numa festa de sábado, natalício de neo-bruxa nos costados da Lagoa. Era chuva que Deus mandava, água pelas canelas, birita vinda da Escócia. Descobri, não sem espanto, que a mulherada de hoje [quase muitas] não amolece os quartos na dança, quer dizer, aquela coisa de chamar na chincha elas nem sabem o que é.
– Deixar-me guiar por macho, to fora! Desculpa-se, meio sem jeito, a sensual balançante. Insisto um pouco, não sou de largar peleia: – Te ensino..., heart to heart, entendeu?! – Ta bom, mas cuide dos calos.
Aos poucos, bem ajeitada, vai se amoldando no abraço, ficando quente e calminha [viu..., foi bom pra você também?!].
Estiquei um pouco o papo: – Então, quer dizer que o feminismo passou do ponto; foi tal a independência entre os sexos, que dançar junto virou quase chauvinismo. – Aliás, fazer qualquer coisa junto, com qualquer um, está ficando complicado, né?! – Pois é, ta cada um por si... não sei onde querem parar! – Epa, vai devagar.. já ta querendo me conduzir. – Calma, dengosa, só queria sincronizar... aqui ninguém ta no comando, a não ser, é claro, o DJ lá em cima. – Isso é metafórico?! – Não, ta mais pra metadêntrico, como diria o meu amigo Cabeça.
Mudando de assunto, comentei com urbanista conterrânea, colega que dança bem e macio: se nossa missão é levar esse pessoal lá pra serra quando a maré crescer, vamos ter que selecionar um pouco; todo mundo não cabe mesmo e as pontes terão mão única.
– É verdade, e não será tipo Noé: casal de tudo que é pêlo. Vamos levar só bicho gente; outros, só os de muita estima. – Então ta combinado! Criaremos a Civilização das Terras Altas [garçom, mais scotch no meu gelo]. Será auto-sustentável e do bem, do jeito que Deus gosta. – Tem que ser muito melhor e diferente, pois se ficar igual a esta não vale a pena fazer força. – Também acho: um novo urbanismo, uma ética porreta, e gente da melhor qualidade.
– Pois é, voltamos àquele ponto... e a tal peneira na turma, como é que vamos fazer? – Eu sugiro critério único: tem que saber dançar junto... quem não souber, ta fora. – Boa... vamos subir o morro dançando, qual a tribo dos felizes. – E quem não aprendeu a dançar junto, tadinhos?! – Bem, não poderemos fazer nada... quem não dançar vai pro céu.
P.S.: Dedico esta crônica a meus queridos amigos Betina Adams, Enio Martins, e Silvia Lenzi [por ordem de entrada...]
Ao Coração da Coxilha Rica [clique na capa para ler on line]
Livro embalado em caixa artesanal de madeira reciclada, com poemas e fotos em páginas soltas 20 x 20, em papel couchê 180, publicado em 2006 numa co-autoria deste com o fotógrafo Philippe Arruda.
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Acordado
não tenho tempo
e o tempo não me tem
estamos de acordo
[com todo o espaço do mundo...]
Devagar
...
...
...
UFA!
enfim somos crianças...
[toda a essência e
toda a graça]
sem máscaras e
charmes fabris